24 abril 2008

O conto da lua - 4

Nosso tempo acabou
Cap. 4 – As respostas

Um dia depois da ligação ele acordou mais cedo que normalmente. Como era uma sexta-feira, levantou de bom humor, assobiando, estralando os dedos e ritmando uma melodia bem característica de fim de semana. Fez a barba ainda assobiando, escolheu a roupa com mais cautela que o habitual, tomou um café da manhã bem reforçado e foi ao trabalho. No caminho só pensava como seria aquele encontro. Apesar do friozinho na barriga que não sentia deste os tempos de colégio, ele estava confiante. Não tinha nada a perder, só precisava olhar nos olhos dela e conversar como bons amigos. O difícil era manter as coisas fáceis assim após tantos anos. No fundo sabia que nada do que planejasse, sairia como tal. Era melhor não projetar nada e deixar acontecer.

E as horas teimavam em não passar. Ele olhava constantemente pro relógio que inclusive tinha sido um presente dela. Apesar de não usá-lo, fez questão de adicioná-lo ao visual. Essa atitude poderia render alguns pontos ao seu favor, como sabia também que poderia ser mal interpretado. Preferiu arriscar.

Chegando ao restaurante, uma hora antes do combinado, apreçou-se em pedir um vinho, precisava relaxar, estava muito tenso. Estralava os dedos o tempo todo, tinha que policiar-se com esses detalhes, afinal de contas seu nervosismo não poderia transparecer. Agora os minutos passavam rápido. Em sua mente, por mais que não quisesse, existia um breve roteiro de perguntas, de assuntos no qual abordaria. A falta do que dizer era o mais desesperador.

Ela chegou, finalmente. Mal poderia acreditar que era ela mesmo que está aqui. Aquele momento que ele tanto esperava tinha chegado. Não mudara muito, continuava praticamente do mesmo jeito. Puxou a cadeira pra que sentasse esboçando um ar de cavalheirismo que nunca teve. Admirada, agradeceu com um sorriso.

- Quanto tempo em! Menino, como você ta diferente, quase não te reconheci. Tudo bem?
- Tudo bem, já você não mudou muito. Continua praticamente a mesma. Foi difícil achar o restaurante?
- Não, não; a cidade ta bem diferente, mas ainda sei me virar. Muita coisa mudou por aqui né, mas apesar do tempo que estou fora, tem coisas que não saem de minha cabeça. Impossíveis de esquecer.

Aquilo soou como uma bomba em seus ouvidos. Teria sido uma indireta ou uma “diretona” bem no meio de sua cara? Ficou sem jeito e mudou rapidamente de assunto para que o rumo da conversa não atrapalhasse as coisas. Apesar de tudo, eram agora apenas bons amigos.

Conversaram sobre muitas coisas, menos sobre o assunto que desejavam. Ambos relutavam em não tocar no assunto. Por mais que resistisse, foi inevitável. A iniciativa partiu dela.

- Aquele lugar que íamos antigamente ainda existe?
- Qual? – Perguntou mesmo sabendo do que se tratava.
- Aquele que dava pra ver a lua bem de pertinho, a beira-mar.
- Ah sim, claro que existe, gostaria de ir lá?
- Sim, se você não si importar, adoraria.

Ao chegar ela ficou parada de pé contemplada com a beleza, olhando para aquele feixe de luz no mar causado pelo brilho da lua, respirando o ar puro com cheiro de maresia. A impressão que se tinha era de que se esticasse o braço, daria pra segurar a lua. Aquele lugar que um dia representou muita coisa, agora não passava de uma bela vista estrelada.

- Não podia ir embora sem voltar aqui, esse lugar é mágico – Disse ela de olhos fechados.
- E você pretende ficar na cidade até quando?
- Achei que você não fosse fazer essa pergunta. Bem, infelizmente meu último dia foi hoje.
- Como assim, você já vai embora?
- Sim, foram duas semanas maravilhosas.
- Então por que você só me ligou ontem de madrugada? Por que não ligou antes?
- Porque se ligasse antes, iria da tempo pra cometer novos erros.
- Você chama de erro o que aconteceu entre nós?
- Não, o que classifico como um erro é o que não aconteceu! Mas é melhor a gente esquecer esse assunto. Nosso tempo acabou.

Ela se aproximou dele, pôs as mãos em seu rosto e disse:

- Nosso tempo acabou, foi bom te rever, mas agora precisamos ir.
- Eu apenas precisava desse reencontro, precisava olhar em seus olhos dessa forma pra que todas as minhas dúvidas não ficassem sem respostas.

- Você já tem essas respostas?
- Acho que sim, já tenho todas. Agora posso dormir em paz.

Ele ficou imóvel e surpreso com o que tinha acabado de ouvir. Agora já tinha todas as respostas que precisava também...

... Será que o tempo acabou mesmo, pensou consigo. Acho que sim. Ele agradeceu por tudo, deu umas batidas na sola do sapato pra cair o excesso de areia e foi embora. Ainda pensou em ficar e dizer alguma coisa que a fizesse mudar de idéia, mas desistiu e foi. Nem olhou pra traz. Afinal de contas ele já não tinha nada mesmo para fazer ali, apenas o confortava aquele lugar. Sabia que nunca mais iria voltar ali, não daquele jeito...

Cap.1 - O outro lado da lua
Cap.2 - O perfume da noite
Cap.3 - O passado se fez presente



2 comentários:

  1. Marcos. Entre começar a ler um texto, e lê-lo até o fim, para mim, depende da fluência. Há textos que te engasgam logo no primeiro parágrafo. Começam totalmente errados. Voce tem a fluência e leveza necessária que conduz o leitor sem maiores atropelos.
    Muito bem escrito.
    Parabéns.
    um abraço
    EdimoGinot

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  2. Muito obrigado pelo elogio! Será sempre uma honra recebe-lo por aqui. Grande abraço!

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