(Zé Laurentino)
Certa feita, viajei
Com destino ao interior
E no ônibus me sentei
Bem pertinho de um doutor.
E o homem conversava
As coisas me perguntava
Pois apesar do estudo
E sua sabedoria
Quase tudo ele sabia
Mas não sabia de tudo.
Por exemplo, perguntou
Num gesto de ironia
Quem foi que me ensinou
A escrever poesia.
Eu lhe respondi patrão
Não tenho certeza não
Mas pra estes versos meus
Que tem sabor silvestre
Eu só tive um grande mestre
A quem conheço por Deus.
Cortava o carro o asfalto
E agente dialogando
Toda viagem é um salto
Quando se vai conversando.
Contemplávamos a paisagem
Que margeava a rodagem
Num quadro bem nordestino
Cavalos, bois que comiam
Casebres que pareciam
Brincadeiras de menino.
Casebres rústicos de palha
Semeados pela serra
Feitos sem viga, sem calha
Os pisos feitos de terra.
Portas que nunca trincavam
Guris raquíticos brincavam
Pelo terreiro da frente
Vendo esse quadro o doutor
Falou assim trovador
Nestas casas mora gente.
Mora, mora um povo semimorto.
Lhe respondi no momento
De que o nome conforto
Não tomou conhecimento.
Em cada casinha desta
Por mais pequena e modesta
Tem dez pessoas ou mais
Ali os filhos se somam
Pois as suas mães não tomam
Anticoncepcionais.
E elas não tomam não
Por não quererem tomar
Lhes faltam orientação
E o dinheiro pra comprar
Mais necessitam de amor
Que é um dom do criador
Fazer amor quem não quis
Assim a todos instantes
Vão produzindo emigrantes
Que irão ao sul do país.
As poltronas desses ranchos
São alguns cepos de paus
Os guarda-roupas são ganchos
As camas quase giraus.
E a alimentação
É um prato de feijão
Um taco de rapadura
Batata doce também
Cuscuz de milho, xerém
Macaxeira, fava pura.
Meninos famintos fracos
Dado a limitada bóia
Os seus lençóis são de sacos
O leito é uma tipóia.
Os seus brinquedos são ossos
Caramujos e outros troços
Que eles acham pelo chão
Na maior variedade
Pois brinquedos de verdade
Eles não possuem não.
E os pais desses meninos
Me perguntou o doutor
São vadios, peregrinos?
Eu respondi não senhor.
São eles homem modestos
Porém honrados, honestos
Que trabalham todo dia
Trabalham tanto aliás
Que talvez trabalhem mais
Do que vossa senhoria.
Só uma coisa é diferente
É que eles tem embaraços
Trabalha o senhor com a mente
Eles trabalham com os braços
O senhor no gabinete
Que parece um palacete
Com todo luxo e requinte
Pobrezinhos que eles são
Não ganham nenhum milhão
Ganha o senhor mais de vinte.
Vive este homem da terra
Que não é dele é alheia
Nesta luta quase guerra
Que é trabalhar de meia.
Com sua mão calejada
Puxa o cabo da enxada
Que as suas forças consome
Para extrair do chão
Essa alimentação
Que o homem da praça come.
Ainda tinha uma coisa
Para dizer o doutor
Porém chegamos em Souza
Cidade do interior.
Eu precisa ficar
E ele tinha que passar
Pois ia pra o Juazeiro
Tão logo me despedi
Peguei a pena e escrevi
Conversa de Passageiro.
Que pena desde criança
ResponderExcluirAdmiro zè laurentino
Mas agora despois de vei
Agindo qui nem menino
Copiou conversa afiada
Deixe disso camarada
isto é muito desatino
Desde a musica que a cama toca
voce foi sempre brilhante
Veio o matuto e o Doutor
que pra nós é diamante
Mas conversa de passageiro
fui eu quem compus primeiro
e foram versos brilhantes
Chamei de conversa afiada
a minha composição
e a publiquei em disco
que está a disposição
É o meu ponto de vista
um abraço de Cobra Cordelista
seu poeta do Sertão