18 dezembro 2007

Brasília, os homens e a cabeça

Era difícil fazer acordo no fio do bigode na capital federal, diferente do sertão de Bolinha. No interior da Bahia, quando alguém comprava alguma coisa e não tinha dinheiro para pagar, dava um fio de bigode como “promissória”. A grossura e a cor do pêlo, avalizado por uma palavra firme, valiam mais que qualquer documento assinado por um homem. Já em Brasília, o que sempre valeu é o preto no branco, acordo oral muitas vezes é sinônimo de maracutaia. O poeta talvez não refletisse sobre esses assuntos cabeludos quando saiu de Montes Claros para assistir a inauguração do “novo eldorado” brasileiro e tentar fazer um “pé-de-meia”. O trabalho numa barbearia na Câmara dos Deputados e as poesias garantiram-lhe, respectivamente, pão e novos amigos por lá.


Por ser um “poeta tribuno”, como se autodefine, João nunca precisou de papel para passar horas declamando Castro Alves, Augusto dos Anjos, Camilo de Jesus Lima e, claro, suas próprias poesias. Inspirado pelas curvas de Niemeyer, ele freqüentou rodas de intelectuais, festas e saraus até o golpe de 64, quando um amigo o alertou:

– João, vá embora que os homens querem sua cabeça!

Se um desconhecido lhe pergunta, hoje, quem foi esse companheiro, ele traga profundamente o cigarro, bate a cinza, solta a fumaça e responde:

– Darcy Ribeiro!

– O Senhor conheceu o Professor Darcy Ribeiro? – delira aquele que pergunta.

– Um homem de uma capacidade incrível! – treplica sem dar muitos detalhes, dando asas à imaginação do curioso.

Como Brasília não tem mar para o peixe grande se entregar à imensidão, Bolinha procurou a primeira rodagem e saiu a flanar pelo Brasil. No caminho, conquistou muitos camaradas, muitos novos versos, muitos amores e, conseqüentemente, 22 filhos.

João Bolinha, um peixe grande
Maiquinique: a derradeira parada



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